19/06/2012

Ângela Correia


A Ângela é, há 22 anos, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde leciona disciplinas como Práticas de Redação e Argumentação, Revisão de Original, Crítica Textual e Literatura Medieval. Além de ser autora de bibliografia científica, escreveu dois romances: Enganos (1997) e Relógios (2010). Estreou-se este ano na literatura para a infância com o livro Guilherme e os Agriões.

A Ângela tem também um blogue, chama-lhe diário irregular, onde escreve coisas bonitas como esta:


Não sei

Está quase
Mandaram recado a dizer que está quase
Mais de um recado; dos que custam a mandar e incertamente chegam.
Sinto a impaciência crescer aqui, onde as costelas se afastam
e poderiam confundir-se com o pormenor de uma borboleta.
Falta pouco, eu sei que falta pouco, já percebi, não nego, não me oponho.
A garganta queixa-se de pressão inusitada
a nuca de um caminho de formigas que corrói.
Volto-me ao movimento da sombra
que também mo diz, mesmo se afinal não era.
Disse-mo a matrícula de um carro branco e
os números iluminados do relógio digital.
Falta o equivalente na eternidade
a dois minutos, não mais.
Ouço passos de ninguém.
Move-se o ar a passagem nenhuma.
Está quase, eu sei.
Disperso, incontenho-me junto à cancela do tempo
e o ar força passagem pelas narinas, aos repelões.
Todos os sinais me chegaram: está quase, falta um pouco que é quase nada.


ngelacorreia.wordpress.com

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